LUCAS DESIDÉRIO

lucas Desidério

Nome: Lucas Desidério

Biografia:

Lucas Desidério de Oliveira Diniz 1997, Fortaleza, CE.

Flor da Messejana, abençoado e amaldiçoado por sentir demais, portanto artista por sobrevivência. Estudante de arquitetura e urbanismo, poeta, ilustrador e aspirante a homem-aranha no instagram @desilustracao.

Poesias

Se cada sonho não realizado

cada tristeza mal resolvida

é um peso que se leva pra caixão

uma cantoria a menos

que se entoa em vida

o quão pesado será o defunto

o quão silenciosos

são os teus dias?

O açoite da noite
é a matraca da morte
fala bem
corteja como ninguém
mas não cala a boca.
Ela me conta de nomes
histórias de olhos
músicas sobre amores
dores metálicas encrustadas
piercing nas memórias.

 

Me pergunto de que janela ela me olhava
em qual arbusto se escondia
enquanto eu vivia
ela escrevia?

 

E em todo escuro que olho
em todo canto de muro,
numa melodia sem vocal
ou nas costas das pálpebras quando me deito.

 

A morte me conta
poesias rimas e acordes
sobre os dias que passaram
já que dormir não posso,
anoto.

Calado,
penso em distâncias.

Em coisas que ecoam
e que não cairíamos
se delas pulássemos.

O prelúdio do beijo
que tanto me fez tremer
e o gosto do beiço
que nem lembro mais
aquela música que era minha
e não sei mais cantar
onde outrora já morei
já comi
já dormi
e ontem fui embora sem fazer barulho.

Aquele outro dia de outubro
e datas de coroa no calendário
que hoje em dia durmo à tarde
pro amanhã chegar apressado
chão que separa
o nunca ter visto
e o enxergar de olho fechado.

Eu falo,
penso em distâncias.

Mas mesmo se não penso
mesmo se penso e não falo,
percorro.

Não há socorro
não há
ponto de retorno
mas rego o coroço.

Do fundo do copo vazio
pra beber outro dia
suco de fruta de novo
agradeço ao tempo
e agradeço ao tempo de novo.

Pior seria
relógio curupira
que me enganasse
e o passado fosse pra frente
e o futuro fosse pra trás.

Triste violino na gravidade lunar

 

Mesmo com meus lábios
tendo percorrido todo o seu físico
sua alma é mistério
lago profundo
cor de sombra
sem som
sem reflexo.

 

Não é só o sexo
até o amarrar de cabelo é mágico
um brilho puro,
educação e bons modos quase sacros
mas o beijo é pecado.

 

Pedra no sapato,
mas eu não cesso o sapateio
veneno que toda as sextas à noite eu me afogo
e não fujo
pois não quero reabilitação, quero overdose…
e não tenho nenhuma das duas.

 

E é só te ver na plateia
não tem salvação
pulo da corda bamba
pra enfiar a cara no chão.

 

E vou, com o coração na mão
ela me chamou…
quem sou eu pra dizer não?

 

Cortaram os cabelos do Sansão
São Jorge sem armadura,
foi comido pelo dragão.

Epitáfio

Sentei pra escrever e tentar descobrir
se tem mesmo que doer tanto assim
se tem mesmo que demorar tanto assim
se temos mesmo que antecipar a dor de amanhã tanto assim
e do amor de amanhã
duvidar tanto assim
que nem todo dia mamar e ainda chorar tanto assim.

 

Sentei pra escrever e tentar descobrir
se a gente tem mesmo
que ser feliz tão pouco assim…
e parece que sim.

 

Parece mesmo que implacável só o vento
que forte mesmo só a chuva
que certeza mesmo só o dia
e que só mesmo tem a noite
o abraço que não morre.

 

Sentei pra escrever e tentar descobrir
mas o lençol que cobria só ficou mais grosso.
Sentei pra escrever e tentar descobrir
e decidi
que já que não vou descobrir
que já que nunca vou descansar minhas costas
na cama da certeza
pelo menos a poeira do lençol  eu vou sacudir.

 

Enquanto sou gente
não menos que gente
não mais que gente
enquanto sou gente
gente serei.

 

Já que
dessa vizinha só
pros sapatos do determinismo nasci com um pé maior
e desde então uma mochila que cabe a consciência
venho aproveitando da oportunidade, primeira e única
que tenho de ser gente
que tenho nascendo do couro
esses olhos esses narizes]
esses canais não fiéis de comunicação
esse jornalismo vagabundo
hora preguiçoso hora sensacionalista
esses poetas erradios
que chamamos de sentidos.

 

Sentei na cadeira
pensei, calado:
se da cadeira vou pra cama
se da cama não levanto
se na terra com minhas rosas preferidas me deitarão
e da terra o despertador há de tocar
um dia há de tocar
e quando soar eu hei de me levantar
como uma erva uma cenoura uma castanha de caju
como uma flauta de bambu
sem mais dor pra me mastigar
sem mais da rotina e da doença
e das promessas e da ansiedade os dentes sujar.

 

No dia que eu então só encher a boca
do bico do bem-te-vi
que beijar a pétala cuja papoula eu colorir
e não puder mais o beiço molhar
de bem me quer desejar
e mal me quer evitar
aproveito enquanto ainda sou
a pinça que vai na flor
uma pétala arrancar.

 

Pois quando minha vez chegar
vou ter muito tempo pra
germinar
crescer
florescer
murchar
e de novo me deitar.

 

Ser flor e deixar ficar
ser chão e deixar ficar
ser tempo e deixar ficar
fossilizar, ser rocha e deixar ficar
pedrinha que se deixa levar
ser rio e mudar
no mar desembocar
ser água e deixar molhar.

 

 

E de tantas vezes que na palavra já pinguei o sal do meu olhar
nesse dia eu vou ser o sal do choro da saudade
que salga os olhos
de quem ousar se apaixonar.

 

Mas não agora
agora rio
rio pois agora eu sou o que chora.

 

Rio
não agora na folha do caderno do poeta
não agora numa moldura
não agora com um ponto final, uma data e uma assinatura
agora com virgulas
agora com ponto e virgulas,
agora com reticências…
agora em poucas sílabas,
agora de uma pancada só num parágrafo de três páginas.

 

Sou a mão que rasura
a cabeça que procura e não acha rima
sou o olho ofuscado
e não o pôr do sol que inspira.

 

já que vou morrer um dia,

Tudo bem.
mas enquanto sou gente
não quero ser flor
não quero ser rocha
não quero ser flauta nem caju.

 

Sou tudo que cabe dentro
Sou tudo que falta fora
Enquanto eu sou
não menos que eu
não mais que eu
enquanto eu sou
completamente serei.